Eu fecho os meus olhos e respiro fundo, muito fundo... enquanto encho os meus pulmões de ar, vejo, dentro do quadro escuro pregado nas paredes castanhas dos meus olhos fechados, uma alternância rápida e confusa de imagens. Cenas de uma vida que me trouxe uma colher pequena de sopa de alegria e centenas de milhares de garrafas repletas de tristeza derretida. Enquanto o trailer acontece, eu percebo que o ar dentro de mim vai se transformando em sensações que têm poderosos efeitos sobre as minhas emoções que neste momento encontram-se todas deitadas e encolhidas no chão melancólico da minha impotência.
Com os olhos bem fechados, ergo as minhas mãos e acaricio a minha frustração mais secreta. Passo as pontas dos meus dedos em seu rosto e sinto que há algo de repugnante em seu semblante. Mais por medo do que por curiosidade, jogo pedras grandes no meu desejo de abrir os olhos e para a minha sorte, acerto na cabeça. Sinto mãos em meu peito... alguma coisa me segura por trás. As pontas das unhas são grandes e uma voz feminina sussurra em meu ouvido:
- Você está feliz, querido? As dores que você sente são versões gigantes das dores que você causou. A diferença está apenas nos graus infinitos de mágoa que as pessoas guardam de você. O rancor triplica o seu sofrimento.
- ...E a culpa asfixia a minha esperança, certo?
- Certíssimo, querido.
Com as suas mãos passando pelo meu corpo, a culpa sopra em meu pescoço, passa a sua língua em minha nuca e morde as minhas costas. Ela lambe as partes internas das minhas orelhas e cospe dentro da minha boca... a sua saliva tem gosto de pneumonia, mas eu não vomito. A negação do vômito me traz uma locomotiva repleta de tristezas que estão
fantasiadas de bailarinas. São tantas...
Elas dançam pra mim. A coreografia é perfeita. A tontura que acaricia os meus cabelos me olha com piedade. Noto que a bailarina que mais se destaca atende pelo nome abismal de Vergonha. E desde que elas entraram, esta foi a que mais me chamou atenção. Tenho fascinação pelas coisas que me humilham e pelos remédios que me fazem mal.
Ela dança como se fosse o balé inteiro. Seus rodopios no ar me fazem esquecer que quero morrer. Em suas sapatilhas há pedaços grandes de minha língua e os seus movimentos injetam arrependimentos em minhas
lembranças mais longínquas.
Abro os meus olhos e recebo a atenção de todas as minhas angústias... elas me dizem que o meu sofrimento enforcou a minha consciência,
mas que esta ainda vive.
Só não se sabe até quando...
Jackson Pedro
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