quarta-feira, 1 de maio de 2013


Eu sempre tinha aquela sensação esquisita. 
Estranha ao extremo. 
Piorava no calor infernal aqui do DF. 
Por vezes eu procurava pelas gavetas, em meio a inúmeras cartas antigas e bilhetinhos amassados a parte de si que lhe parecia ter escapulido. 
Talvez sua alma travessa estivesse de peraltices, talvez não. 
Revira daqui e dali. 
A sensação aumenta rapidamente. 
E quanto mais aumentava, mais bisonha ela se sentia. 
Ao mesmo tempo que se sentia escapulindo de si mesma, não cabia em si. 
O corpinho pequenino, cada vez mais, era uma fronteira prestes a ruir. 
Não sabia. Mas adivinhava-o, sentindo na pele e na alma. 
Então visitava-lhe o bom e velho medo.
Aquele medo que mora perto da linha que faz fronteira com o pânico. 
Sempre ele. 
Bicho papão travesso e danado que sobreviveu à infância. 
Escondia-se dele na maciez poética e ilusória das coisas ainda não sonhadas e fazia da esperança uma espera desassossegada e desassossegante que se escondia ali, bem ali, no carnudo voluptuoso que os desatentos chamariam, simploriamente, lábios. 
Calava neles os mistérios das noites carregadas de melancolia, orvalhadas de uma saudade inteira, com elementos de uma tristeza fúnebre. Silenciosamente, chorava... engolia o gemido a seco. 
E chorando não podia ver que as fronteiras não mais existiam.
Imensa de delicadezas, explodiu em muitas cores. 
E muito mais amores.

Talvez um dia ela volte... atrevida e sapeca, destilando ironia e irreverência. Escorregando sorridente no mais poderoso dos arco-íris.
Paletas cheias de empolgação. 
Aquarelas sorridentes. 
Abraços de tinta desenhados com os dedos em minhas alvuras, das minhas negruras, da minha ausência de cores.

Assim espero. 


Literatura do Desassossego


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