quarta-feira, 1 de maio de 2013

APONTAMENTOS À MARGEM PARA DESMARGINAR – VI

ESPECISMO E MULTICULTURALIDADE 

Embora a espécie humana tenha sido aquela que melhor se emancipou na (e da) natureza, deixando de estar sujeita às suas contingências, o que é certo, é que cada forma de vida é idiossincrática, rara, única e inimitável, singularidade pela qual se devem observar atenciosos cuidados em consideração e respeito pelas condições do seu florescimento, bem como pelo equilíbrio do habitat que a integra. As capacidades do ser humano, o seu empenho, arte, engenho e espírito gregário-expansionista, permitiram-lhe ultrapassar quase todos os constrangimentos naturais, contudo devemos reconhecer que há limites e fronteiras decorrentes das leis da natureza que não podemos violar, e que põem em risco a nossa hegemonia terrena. (Qualquer vírus ou bactéria nociva tem mais possibilidades de nos dizimar do que nós a ela…) E um deles é o das monoculturas e eleição de espécies no povoamento de largas parcelas do território, por motivos econômicos ou de facilitação instrumental dos ecossistemas, selecionando e incentivando a proliferação de muito poucas espécies em detrimento das restantes (especismo), diminuindo a sua resiliência face aos elementos, à desertificação e falência, atingindo consequentemente a comunidade humana aí hospedada. 

Ou seja, para contrariar as dificuldades naturais de expansão e sobrevivência praticamos a manipulação do meio ambiente, durante milênios  através do especismo, estratégia essa que foi globalmente tida por sensata; todavia, sabe-se atualmente, que ela pode acarretar-nos dissabores e danos irreparáveis, tanto no ecossistema como na economia das regiões, tanto na ecosfera como nas condições de vida do indivíduo, porquanto o atrofiamento da sua sustentabilidade é bem maior do que os benefícios auferidos, uma vez que as monoculturas são mais atreitas aos efeitos das catástrofes naturais e das alterações climáticas. Porque fazer depender a sobrevivência de uma população de um só produto, é fazer perigar esta à menor fragilidade da sua (re)produção. 

Por conseguinte, chegou a altura de inverter o curso das decisões e rejeitar todas e quaisquer práticas culturais que ponham em causa a integridade da fauna e da flora de um lugar, ou as suas particularidades geográficas e territoriais, não só quando provocam elevada mortalidade e extinção de espécies, como é o caso de inúmeros rituais e tradições, sacrifícios e eleição de símbolos emblemáticos para marketing, ou de tomar medidas radicais de desinfestação, por pesticidas e herbicidas de efeito durador nos solos e/ou atmosfera, e ainda a promoção de eventos de diversão com animais (touradas, circos, lutas, exposições não-científicas) e comercialização de espécimenes selvagens ou exóticos, e enveredar definitivamente por uma opção generalizada de atitudes e comportamentos que difundam e disseminem a diversidade (multiculturalidade) específica e cultural, de raças e credos, pois os ambientes (e nações) mais ricos, fecundos e sustentáveis, não são os que se resumem e fecham sobre si, mas os que se cambiam e multiplicam contemplando a biodiversidade e o maior número possível de janelas de oportunidade, mobilizando todos os seus recursos endógenos para promover a cooperação e o desenvolvimento autônomo  assim como a segurança e bem-estar das suas populações (humanas e não-humanas). 



J Maria Castanho


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