sábado, 19 de outubro de 2013


Toco com as pontas dos meus dedos aquilo que estrangula o meu sossego. Cheiro um tecido branco e barato e levo aos meus pulmões o aroma das teorias filosóficas que, vez ou outra, me servem de consolo. De olhos fechados, ouço os sons dos dominós que os bêbados Aristóteles, Sócrates e Platão jogam em uma praça qualquer de Atenas. Com as palmas das mãos eu esbofeteio a cafonice destas fugas inúteis que eu dou a mim mesmo e sinto piedade do que em mim clama por três tapinhas nas costas... a sagração máxima dos fingimentos que eu, inutilmente, aprendi a conviver e a olhar nos olhos furados do bom senso e distribuir xingamentos mentais quando a educação cristã aponta o dedo em meu rosto e diz, aos berros, que o mal se paga com o bem. Uma chuva de arrependimentos picados cai sobre mim.
Ando quase parando, pisando nas pontas dos pés, para não acordar o meu desespero. Arregalo os meus olhos para não perder os detalhes visuais das minhas misérias. Torno-me valente por dois segundos e no instante seguinte distribuo panfletos com as letras garrafais de minhas covardias gordas e disformes. Um velho cospe um torresmo gorduroso em meu rosto... Platão, seu safado. Eu acreditei naquela balela de mundo das ideias, etc e tal. Sempre distribui santinhos seus e desmenti o Ari (stóteles) na cara dura, pois a cantiguinha de ninar sobre os sentidos nunca me excitou. Só sei que eu nada sou, Sócrates... nunca fui. A sua frase está mais ou menos certa, isto é, mais ou menos errada também. O inglesinho blasé, Shakespeare podia ter dito: saber ou não saber, eis a questão. Descobri que a ignorância tem o seu lado bom. Às vezes passar batido no mundo, sem ter noção nenhuma sobre o amor, o prazer, a dor e o sofrimento é o que chamamos de felicidade.

- Tire a sua roupa e deite-se ali.
- Sim, doutor.
- Faz tempo que você sente isso?
- Sim... desde que terminei a faculdade.
- Acha que se não fosse a faculdade você estaria com essa enfermidade?
- Com certeza não.
- Vamos ao centro cirúrgico agora. A enfermidade está te ganhando.
- Doutor, eu tenho medo.
- O medo é a revolta da enfermidade. Ela não quer sair de você e usa a sua fraqueza para se tornar mais forte.


Platão... Sócrates... Aristóteles...
Onde estão vocês? Me deixaram sozinho. Eles fizeram um tricô em minha pele. Vocês que sempre falaram mal de Deus agiram como ele: me deixaram sozinho quando eu mais precisei.

Entre a realidade e o torpor, há os efeitos de uma anestesia que me deixa mole como um filé de peixe. Anestesia que encobre a dor física e que desmascara a dor mental.
Será que de tanto falarmos mal de alguém nos tornamos, inconscientemente, como esse alguém?

Freud, venha cá... eu tive sonhos incríveis que eu queria te contar... mas por favor, deixe o Marx fora disso. Há muitas classes entre os meus sofrimentos e as desigualdades sentimentais são, deveras, absurdas.


Nenhum comentário:

Postar um comentário